Visando enxugar drasticamente o governo federal e expulsar quem não apoia a agenda política de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, sua administração ofereceu, na terça-feira 28, pagamentos em troca da demissão de 2 milhões de trabalhadores federais.
Quem aceitar a proposta, enviada por e-mail pelo Gabinete de Gestão de Funcionários, receberia seu salário normalmente, sem ter que comparecer ao escritório, até o final de setembro. Os trabalhadores tem até 6 de fevereiro para aceitar a oferta, enviando de volta uma mensagem apenas com a palavra “resign” (demissão). Então, essencialmente serão colocados em licença administrativa de imediato.
O e-mail afirmou que a maioria das agências federais provavelmente será reduzida e que um número substancial de trabalhadores seria colocado de licença obrigatória, em paralelo ao cancelamento de garantias trabalhistas de funcionários públicos, no intuito de substituí-los por aliados. “Neste momento, não podemos dar a você garantia total sobre a certeza de sua posição ou agência”, disse o texto.
Além disso, a maioria dos que estavam trabalhando de casa será obrigada a voltar ao escritório por cinco dias por semana, disse o Gabinete de Gestão de Funcionários, acrescentando que algumas pessoas devem ser realocadas. A estratégia é dificultar a vida de quem mora longe, até em outros estados, para incentivar demissões.
A mensagem também dizia que “padrões de conduta aprimorados” seriam aplicados para garantir que os trabalhadores fossem “confiáveis e leais”.
Limites do poder
Com a mudança, o presidente testa os limites de seu poder, tentando passar por cima da lei federal que rege os pagamentos e regras que há muito protegem funcionários públicos de interferência e pressão política.
A medida também pode desmantelar uma ampla gama de agências federais das quais os americanos dependem. Atividades regulares como viajar de avião, renovar passaportes ou preencher uma declaração de imposto de renda poderiam ser atrasadas ou interrompidas. A operação de parques e museus nacionais e a administração de benefícios como seguro de saúde e assistência a veteranos podem ser afetados. Reguladores e inspetores de alimentos, água, medicamentos e segurança no local de trabalho também podem deixar o governo. Até oficiais do FBI e da DEA, a agência antidrogas do país, poderiam ter que se demitir, arriscando uma crise de segurança.
A mensagem do governo Trump ecoou um e-mail que Elon Musk, seu novo aliado favorito e cortador-mor das despesas do governo no comando de uma nova agência federal, enviou aos funcionários do X, antigo Twitter, após comprar a rede social no final de 2022. Na mensagem, o bilionário falou do mesmo assunto e ofereceu aos funcionários três meses de indenização em troca de demissão.
Musk, cabeça do novo Departamento de Eficiência Governamental, não trabalha oficialmente no Gabinete de Gestão de Funcionários. Mas a agência contratou vários aliados do CEO nas últimas semanas, incluindo Amanda Scales, que até então trabalhava na empresa de inteligência artificial de Musk, a xAI, e agora é chefe do escritório.
Em uma postagem no X, Musk compartilhou uma mensagem afirmando que a oferta de pacotes de indenização poderia levar a bilhões de dólares em economia.
O que diz a lei americana
Não está claro qual se o governo Trump tem autoridade para oferecer pagamentos em troca de demissão a, efetivamente, toda a força de trabalho federal. De acordo com a lei, nenhum funcionário pode ficar em licença administrativa por mais de 10 dias em um ano — muito menos mais de sete meses, como diz a proposta.
De acordo com a Lei de Segurança Interna, agências que forem enxugadas ou reorganizadas podem oferecer 25 mil dólares (quase 150 mil reais, na cotação atual) em troca de demissão, uma prática conhecida como Pagamento de Incentivo à Separação Voluntária. Em muitos casos, porém, os montantes propostos no e-mail do Gabinete de Gestão de Funcionários excederiam em muito esse limite.
A Federação Americana de Funcionários do Governo, o maior sindicato de funcionários federais dos Estados Unidos, que representa mais de 800 mil trabalhadores, foi rápido e veemente ao condenar a medida.
“Há mais americanos do que nunca que dependem de serviços públicos”, disse Everett Kelley, presidente do sindicato. “Expurgar o governo federal de funcionários públicos de carreira dedicados terá consequências vastas e não intencionais, que causarão caos para os americanos que dependem de um governo federal funcional.”