Fogo teria sido iniciado em uma propriedade vizinha e seguido até as propriedades da Fazenda Bela Vista, em Crateús; prejuízo é estimado em R$400 mil
Um incêndio de grandes proporções queimou 132 hectares da fazenda Bela Vista, propriedade agrícola no município de Crateús, distante 355 quilômetros (km) de Fortaleza. O incidente aconteceu no dia 28 de agosto passado, início do segundo semestre, período caracterizado pela maior ocorrência de queimadas no Ceará.
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O incêndio teria sido originado na fazenda Belo Horizonte, propriedade vizinha, após a perda de controle sobre um “campo de fogo”, antiga técnica agrícola que utiliza fogo para a limpeza do solo contra pragas e preparação para novos plantios.
Devido ao risco de propagação das chamas, a prática é restringida no País desde o ano passado, com a publicação da Lei Federal 14.944/24. A norma estabelece que as queimas controladas só podem ser realizadas mediante laudo técnico em áreas de baixo risco de propagação de fogo, e com autorização dos órgãos ambientais competentes.
A prática teria sido usada perto da divisão entre as duas fazendas, saído de controle e avançando sobre o território da Bela Vista, onde são mantidos bovinos, caprinos, ovinos e peixes em criadouro para produção de derivados, corte e comercialização.
Imagens das câmeras de segurança que monitoram a propriedade flagraram o avanço do incêndio, que começou por volta das 17 horas do dia 28 e só foi encerrado na tarde seguinte, após atuação do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará (CBMCE).
Segundo o proprietário da fazenda Bela Vista, Renan Mourão, nenhum dos animais criados no local foi atingido pelo fogo. Entretanto, parte essencial do capim utilizado para pastagem, cercas e alguns equipamentos da unidade foram queimados, em prejuízo que ultrapassa a casa dos R$ 400 mil.
“Mandei fazer um laudo pericial e chegamos à conclusão que com a perda de capim, lucros cessantes e tudo, o prejuízo deve ser de R$ 401 mil. O grande problema hoje aqui vai ser a alimentação para os animais, porque eu tenho um rebanho de ovinos de 1000 animais e bovinos de mais de 200 animais. A reserva alimentar que eu tinha foi destruída pelo fogo”, afirma o produtor.
Os prejuízos também consideram a compra de forragem para manter a alimentação dos animais até a recuperação do solo da fazenda, já que todo o capim e reservas alimentícias foram consumidos pelo fogo.
O caso foi registrado como crime de incolumidade pública na Delegacia Regional de Crateús, unidade da Polícia Civil do Estado do Ceará na cidade. A pena para o delito é de seis meses a seis anos, a depender das características do crime.
A queima de vegetação também é enquadrada na Lei Federal 9.605/98, que dispõe sobre os crimes ambientais no Brasil. O texto prevê pena de seis meses a quatro anos, a depender se o delito teve dolo ou não.
O POVO procurou o proprietário da fazenda Belo Horizonte para mais detalhes acerca do ocorrido, bem como saber se havia autorização para o uso de campo de fogo na região. Entretanto, o fazendeiro não atendeu às ligações.
A Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) informou que investiga o crime contra a incolumidade pública do último dia 28 de agosto, na localidade de Riacho do Mato. Um Boletim de Ocorrência (BO) também foi registrado, em 29 de agosto, na Delegacia de Crateús, unidade à frente das investigações.
Seca e altas temperaturas propiciam aumento no número de queimadas durante o segundo semestre
O caso visto em Crateús é um dos muitos que ocorrem anualmente no Ceará durante o segundo semestre. Com a falta de chuvas e altas temperaturas, o solo e a vegetação ficam mais secos, estando assim mais propensos à ignições de fogo.
O período do ano traz também os fortes ventos, que auxiliam na propagação das chamas após iniciadas. Essa combinação é conhecida como fenômeno 30-30-30, onde temperaturas acima de 30°C, umidade relativa do ar abaixo de 30% e ventos acima dos 30 km/h colaboram para a ocorrência de grandes incêndios.
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Ceará registrou 460 focos de incêndio entre os dias 1° de julho e 11 de setembro deste ano. Essas ocorrências, entretanto, não são causadas apenas pela existência dos três fatores no Estado, mas na maioria das vezes, contam com participação humana efetiva.
“No Brasil são raras as ignições espontâneas. A gente sabe que a maior parte das queimadas são decorrentes de atividades antrópicas. Alguém foi e colocou fogo. Agora a propagação, a velocidade com que isso se espalha, aí sim depende de questões meteorológicas”, explica a agrometeorologista e pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Ana Paula Cunha.
Ainda segundo Cunha, o caminho para a redução de grandes incêndios originados por queimadas agrícolas passa pela educação ambiental das novas gerações de agricultores, com enfoque em técnicas mais seguras de preparo do solo.
Apesar da ainda existência de casos como o das fazendas em Crateús, a mudança das queimadas para meios não prejudiciais de manejo já pode ser observada na redução do número de queimadas registrados pelo CBMCE no Estado.
Segundo dados da corporação, 481 incêndios em vegetações foram atendidos durante o primeiro semestre deste ano, 55% a menos do que os 1070 anotados no mesmo período de 2024.
A corporação atribui a queda a ações preventivas, como os aceiros, clima úmido durante os seis primeiros meses do ano, aumento da quadra chuvosa e maior conscientização da população.
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